Eles viajam há 30 anos, foram a primeira família brasileira a dar uma volta no mundo a bordo de um veleiro e fizeram sua terceira aventura ao redor do globo, a Expedição Oriente. Conheça o estilo de vida da família Schurmann numa entrevista exclusiva ao Carpe Mundi.

Como lidar com a solidão em alto mar?

Temos uma condição especial pois, desde o início, nossa relação com o mar foi um caso de família, um sonho compartilhado. Tudo começou numa viagem ao Caribe (Vilfredo e Heloísa), quando entramos num veleiro pela primeira vez e decidimos que ainda voltaríamos àquele paraíso em nosso próprio barco e com os nossos filhos. Hoje, 30 anos depois, temos a família toda reunida a bordo da Expedição Oriente, inclusive nosso neto Emmanuel. Mesmo assim, existem momentos que são muito particulares. São únicos e de cada um. E esse breve instante de solidão é fantástico. É o momento em que temos o infinito diante da gente, o vento tocando nosso rosto, as estrelas brilhando num imenso céu… E, muitas vezes, golfinhos e até baleias nos acompanhando de perto.

E a saudade do conforto, da civilização?

A vida a bordo pode ser bastante confortável também (risos)! Há 30 anos, o exercício do desapego foi mais drástico. Hoje é mais tranquilo por diversos motivos. Por um lado, aprendemos que não precisamos de closets imensos com centenas de peças – nosso armário tem 1,50m x 1,0m. Por outro, temos toda a tecnologia que nos mantêm conectados com quem permanece no continente. O mais difícil é a saudade de quem amamos. Mas hoje também é fácil contornar isso: podemos nos ver ao vivo pelo celular e por aí vai.

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Então podemos dizer que, pra largar tudo e sair explorando o mundo, um viajante precisa de muito desapego?

Desapego total! E esse exercício começou em Florianópolis, no dia 14 de abril de 1984, quando deixamos pra trás, casa, carro, trabalho, escola e o conforto da vida em terra firme. De lá, zarpamos para realizar o sonho de nossas vidas: dar uma volta ao mundo a bordo de um veleiro. Pra tornar esse sonho em realidade, a preparação foi longa e exigiu sacrifícios. Foi um ano de planejamento pra cada ano passado no mar. Fizemos vários treinamentos em diferentes áreas: navegação, primeiros socorros médicos e dentários, eletricidade e eletrônica. Depois, durante a viagem, nos tornamos empreendedores realizando charters com o veleiro, os meninos deram aulas de windsurf e mergulho, Heloísa escreveu artigos para revistas e publicações especializadas… Escolhemos a rota dos navegadores que seguem os ventos alísios. Navegamos dez anos pelos oceanos Atlântico, Pacífico e Índico. Seguimos do Caribe pelo Canal do Panamá e seu litoralBarbadosGalápagosBora BoraIlhas FijiMadagascar e Cidade do Cabo, entrando em contato com uma riquíssima diversidade paisagística, cultural e humana. Mais importante que a fascinante oportunidade de conhecer o mundo, a convivência permitiu que tivéssemos o privilégio de compartilhar em família essa grande aventura de vida.

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O que vocês diriam pra quem planeja se aventurar numa volta ao mundo como a Expedição Oriente (seja de veleiro ou não)?

Pra começar: saiba que os desafios fazem parte da aventura. Costumamos dizer que o início é ter a persistência necessária para, mesmo com muitas negativas, continuar seguindo e acreditando, até o momento de fazer acontecer. O segundo é o esboço dessa aventura. Dar a volta ao mundo é um projeto multifacetado, que exige uma programação específica pra cada etapa e destino diferente. Pra quem deseja viajar a bordo de um veleiro, por exemplo, o planejamento vai desde a construção do barco e o roteiro detalhado da viagem até o treinamento necessário da tripulação. Já o terceiro e maior desafio é a expedição em si: no mar, é necessário, além de desenvolver o espírito de equipe e a boa convivência, fazê-los num espaço pequeno como o de um veleiro, e ainda têm os contratempos das tempestades.

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O maior perrengue que vocês viverem até agora foi este, uma tempestade?

Sim, na costa da Nova Zelândia, na nossa primeira viagem, quando enfrentamos baixa pressão com ventos ciclônicos de 135 km/h e ondas de 10 metros de altura.  Naquela tempestade, perdemos os dois mastros e ficamos no mar por 11 dias até chegarmos de volta ao porto de Auckland. Encontrar tempestades, furacões ou ciclones é sempre um momento extremamente delicado. Por isso, a serenidade é fundamental para lidar com qualquer fenômeno natural. É preciso ter calma para calcular os riscos, tentar prever o imprevisto, organizar a tripulação, preparar a embarcação e encarar a situação com a certeza de que vai dar tudo certo.

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E o destino mais legal que vocês já visitaram, qual foi?

O destino mais legal? Poxa, que difícil! São tantos lugares incríveis! Das expedições anteriores, os melhores momentos que tivemos foram velejar nos fiordes da Patagônia argentina e navegar nas ilhas da Polinésia Francesa. E estamos muito felizes por termos vivenciando novamente essa experiência com a Expedição Oriente. Há pouco tempo, durante uma entrevista, David apontou algumas cidades preferidas por ele, que achamos bacana destacar: Ilha Anegada – Ilhas Virgens Britânicas, uma das ilhas mais remotas do Caribe, local de paz e com um povo acolhedor; Moorea e as ilhas de TuamosFakarava e Hangiroa, especiais pra quem curte mergulhar, na já mencionada Polinésia Francesa; e Auckland, na Nova Zelândia, onde existe o Café Santo, fundado em 1995 por um surfista de Floripa. Agora, na Expedição Oriente, a Antártica nos fascinou. Mas ainda falta conhecer o Oriente, onde deveremos estar no próximo ano, quando concluiremos as 30 mil milhas e visitaremos todos os 29 países do trajeto.

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Anna Laura

Um dos maiores nomes do turismo no Brasil, Anna viaja há 10 anos em busca de construir um mundo mais consciente, sustentável e a favor da natureza, propondo mais autoconhecimento através de suas experiências pelo globo. Jornalista por formação e fotógrafa por vocação, é editora do Carpe Mundi e Co-founder da plataforma de curadoria em aluguel de temporada Holmy, 100% nacional e de equipe feminina.

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